Manifestantes

O choque de gerações que choca o Brasil

As manifestações que tomam conta do Brasil não dão sinal que acabarão tão cedo. Estão virando rotina.

Enquanto isso, multiplicam-se explicações de todos os espectros políticos para o fenômeno.

Mas o fato de nenhum grupo convencional conseguir se apropriar das manifestações (pelo menos até o momento) mostra que trata-se de um movimento organizado descentralizado, no espírito das redes sociais.

Sem líderes, com seguidores.

A confusão que isso gera é inacreditável. É como se ninguém percebesse a quebra de paradigmas que estamos vivendo.

Como se ninguém percebesse que um negro preside a Casa Branca e uma mulher é a nossa presidenta.

Temos dirigentes progressistas eleitos no comando a despender uma energia preciosa imensa em peladas pelo poder com os conservadores, velhos, retrógrados, entre bons momentos, caneladas e alguns gols contra.

Mas uma geração alheia à tudo isso estava em formação. O choque, inevitável, uma questão de tempo para que a primeira juventude que se formou com a internet chegasse na faculdade, e percebesse que o mundo lá fora estava tomado, alugado.

Que, apesar de aprenderem desde cedo a valorizar a comunicação livre e aberta, não teriam acesso às antenas de TV, emissoras de rádio, jornais e revistas.

E ela não se contentará em ser relegada aos cantos das reportagens, às sonoras superficiais para provar algum ponto pré-decidido em reuniões de pauta dos telejornais.

Não aceitará ficar quieta assitindo a novela, porque não aprendeu a ficar quieta vendo novela.

Porque não existem ídolos da sua geração, suas músicas preferidas não conseguem tirar aqueles clássicos do inconsciente coletivo.

Essa geração, diferente das anteriores, está se recusando o a acreditar que chegou tarde para a festa, e que só o que resta seja escolher entre a marca A ou a marca B.

São pessoas que querem transporte público de graça, mas também querem apartamentos, empresas, tentar a sorte e criar suas startups.

E fazer filmes, jogos de videogame, encontrar seu espaço e desenvolver sua vocação verdadeira.

É o primeiro protesto de um Brasil com uma classe média volumosa o suficiente para fazer massa crítica e parar a Marginal Pinheiros. Pessoas que cresceram em uma realidade tão difusa e estranha que quase não há traços de identidade com esse Brasil do futebol, da mulata, do samba.

Uma geração que, não duvide, ainda pode acabar com o carnaval, desiludida e cansada do pastiche e do silicone barato.

Entender essa geração é entender que as anteriores não largam o osso quando há muito deveriam, não tivessem comprado a ideia de viver para sempre entre fileiras de igrejas e agulhas de botox.

E que, por isso, nessas noites uma geração inteira vaga aparentemente sem rumo pelas nossas ruas. Sem bandeiras políticas óbvias, provocando a incompreensão catatônica de quem é capaz de identificar apenas uma horda de zumbis ideológicos.

Mas na concepção de liberdade desse grupo, o comprometimento formal com um partido é um aspecto restritivo de liberdade. A união cala a boca, mesmo que o papel do indivíduo ainda esteja indefinido nessa relação inédita em que o público e o privado se misturam entre posts e downloads.

É o mundo da rede social como filosofia de vida. E não existe outro lugar para você ser ouvido, apenas lá fora.

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